#58 - quem conta a sua história?
as pessoas não estão interessadas em você, elas querem saber quem você é
"Jout Jout morreu; agora a gente precisa conhecer a Julia.”
Já havia ficado bem reflexiva com a primeira parte da entrevista exclusiva que trouxe notícias de Jout Jout e sua nova vida, os motivos para ter escolhido se afastar do sucesso que fazia na internet e se apropriar da sua verdadeira identidade. Daí veio a segunda parte, em mais um episódio do podcast De Saída - A Vida Fora da Internet e essa frase se conectou com tudo o que eu tinha absorvido nos últimos dias.
Em tempos de redes sociais dominando narrativas e te fazendo acreditar que o mundo é o que está na tela do seu celular, histórias reais impressionam.
Tamara Klink1 impressinou ao contar sua história em entrevista ao programa Roda Viva e abrir detalhes da sua trajetória de privilégios, coragem, superação e sobrevivência sozinha em alto mar, nos mostrando, com honestidade e segurança, os desafios que envolvem a realização de um sonho e o encontro consigo mesma.
Depois de ouvir a Tamara compartilhar sua experiência de quase morte durante a invernagem no Ártico2 e a Julia3 reafirmar que segue escolhendo não mais dar vida à Jout Jout, eu assisti Senna na Netflix e essa história também impressionou - e nem tô falando do elenco incrível, das atuações brilhantes e da produção impecável.
Tenho vagas lembranças da época em que Ayrton Senna se tornou o maior campeão de Fórmula 1 de todos os tempos - meus pais eram muito fãs e eu jamais esquecerei aquele domingo triste, em que ambos encaravam a TV incredúlos e com lágrimas nos olhos. Mas o pouco que lembro e que pude acessar por meio das histórias contadas sobre ele, me mostram um cara que foi além dos títulos.
Alguém que vivia seus valores na prática, questionando o óbvio que todos fingiam não ver por medo ou conveniência. Uma pessoa que respeitava as regras, mas não considerava justo baixar a cabeça quando a pauta em questão mexia com seus ideiais. Um apaixonado pela família e por se fazer presente, mesmo há quilômetros de distância.
Apesar das opiniões controversas, senti que a proposta da Netflix conseguiu transmitir com louvor essa mensagem. É sabido que a família do ídolo se envolveu em todas as etapas de construção e aprovação do roteiro da série.
E aqui, chegamos na primeira reflexão: a história que a família Senna escolheu contar nesta produção milionária é a história dos valores pessoais que ele deixou vivos no núcleo familiar. É a história do Beco: um Ayrton carinhoso, sensível, disciplinado e muito consciente do seu papel para além das pistas e pódios.
Talvez essa não seja a história do Senna que a Adriane Galisteu relatou em seu livro décadas atrás e nem a história do grande amor da vida da Xuxa, que hoje faz questão de enaltecer sempre que a perguntam sobre essa fase da sua vida. Também pode não ser o Senna que viveu até hoje no imaginário dos brasileiros e todos os apaixonados por Fórmula 1.
A sua história varia de acordo com a perspectiva de quem a conta. E o contexto em que você vive e convive com as pessoas, influencia diretamente nessa construção.
Há alguns anos, ao estudar RH e estratégia organizacional para gestão de pessoas, cheguei à conclusão de que toda história tem três versões: a sua, a minha e o que realmente aconteceu.
Na teoria, a gente sempre é orientado a pensar em todas as possíveis vertentes de um fato ocorrido. Mas, na prática, temos uma tendência a olhar mais para aquela versão com a qual nos identificamos pessoalmente. Seus valores pessoais moram nessa atitude. Sua forma de ver o mundo está presente em tudo o que você pensa, faz e fala. E naturalmente, ao contar uma história, essas referências serão a base da sua narrativa.
A Tamara Klink se apropriou da narrativa e tem a oportunidade de contar a sua história enquanto ainda a constrói, mostrando, na prática, como viver de acordo com seus valores pode ser tão perturbador quanto gratificante.
Julia escolheu o retiro, o silêncio, a ausência. E decidiu confiar a uma ilustre jornalista desconhecida a missão de contar a história dos seus últimos quatro anos reclusa, sabendo que existem diversas teorias e versões diferentes sobre esse seu afastamento na mente das pessoas que a acompanhavam e também daquelas que apenas ouviram falar sobre uma youtuber que se chamava Jout Jout.
Mas e o Senna? Será que apresentaria a vida dele como nos mostra os seis episódios da minissérie da Netflix?
Quando você não pode mais contar a sua história, é a sua reputação e as relações que você construiu que fazem isso por você.
Os valores do Senna foram abordados na história pela perspectiva da sua família sobre a pessoa que ele foi e o legado que construiu.
Assistindo à série e às duas entrevistas, fortaleci a ideia de que as relações de confiança que construímos ao longo da vida são a base para a formação da nossa identidade. Percebe como a gente precisa ter atenção às pessoas que nos cercam e que a gente escolhe manter por perto?
Investir na qualidade das suas relações é também investir na sua história.
Acessar essas três histórias na mesma semana me fez pensar em três perguntas que, deixo agora pra você relfetir e buscar responder:
Qual é a sua história?
Como você gostaria que essa história fosse contada?
A quem você confiaria a missão de contar a sua história?
Tamara Klink é uma velejadora e escritora brasileira. Aos 24 anos, tornou-se a mais jovem brasileira a fazer a travessia do Oceano Atlântico em solitário[1].
Matéria Fantástico - A aventura corajosa da primeira mulher a passar inverno isolada no Ártico.
Julia Tolezano da Veiga Faria (Niterói, 14 de março de 1991), conhecida pelo apelido de Jout Jout, é uma vlogueira, escritora e jornalista brasileira. Julia é conhecida pelo seu canal no YouTube: JoutJout Prazer, que alcançou a marca de mais de dois milhões de inscritos.
oi, aqui é a Lu. :)
e há pouco mais de 1 ano eu decidi abrir mão de uma vida estável na zona sul do Rio de Janeiro, junto de uma carreira bem sucedida de 15 anos no mundo corporativo, para realizar o sonho de viver uma vida mais leve e ajudar outras mulheres a desenvolverem a liderança que eu acredito: orientada por valores.
se você está lendo essa carta no seu e-mail, saiba que eu vou adorar receber uma resposta sua sobre como esse texto ecoou por aí; fique à vontade para me escrever! :)
Uma coisa que me chama a atenção na trajetória do Senna é ver como ele passava honestidade sem hostilidade.
Mesmo nos momentos mais tensos das corridas e do convívio com os colegas de trabalho, ele passa a sensação de que mesmo reclamando ou discutindo, ele não está tentando atacar a pessoa, mas expressar suas ideias e, na mente dele, colocar juízo na cabeça do outro.
É uma preocupação maior em ver o trabalho bem feito do que em ferir o colega.
Pensei sobre como minha vida seria contada por diferentes pessoas e é muito claro como seriam narrativas completamente diferentes. Muito ótimas suas reflexões, me deu mais vontade de iniciar um projeto sobre mim mesma, que não sou nada importante, mas que gostaria de contar meu lado da história