#04 - motivos pra chorar
Quando finalmente sentei no chão, pensei: “eu nunca mais vou conseguir levantar".
Eu lembro que foi muito rápido; de repente, me faltou o ar.
Ergui os olhos e me senti como numa cena de filme, em que a imagem turva vai se tornando quase impossível de enxergar. Percebi que o som ambiente começou a se distanciar. Ainda sentada, senti meu coração acelerar e comecei a suar frio.
Ninguém prestou atenção, afinal, tinha muito café e pouco tempo pra cada líder ali presente enfatizar a sua opinião pessoal sobre como acreditavam que a gente deveria seguir com o problema projeto.
Até hoje não sei quanto tempo levei para conseguir levantar, atravessar a sala e sair sem causar alarde.
Quando entrei no banheiro próximo dali, senti que meu corpo, que tantas vezes buscou me dar sinais daquela exustão, tinha chegado no limite. Minha mão molhada de suor encontrou, na parede gelada, o apoio para evitar a queda que, a essa altura, parecia a melhor forma de sair daquela sensação com a qual eu não sabia lidar.
Eu tinha tudo o que uma “mulher bem sucedida” sempre sonhou ter: carreira de sucesso, um marido incrível, salário acima da média do mercado e reconhecimento externo.
O que será que faltava então? Por que será que eu não conseguia pensar em outra coisa se não chorar e desistir?
Foi meu blazer bege mudando de cor que me fez perceber que as lágrimas já estavam ali, implorando pra que eu as deixasse transbordar.
Quando finalmente sentei no chão, pensei: “eu nunca mais vou conseguir levantar".
Levou um (bom) tempo para eu escrever uma mensagem pedindo ajuda e sair dali.
Amanhã, 28 de setembro, esse episódio completa 2 anos.
E por que eu tô te contando isso?
Porque eu não quero que te faltem bons motivos pra chorar.
Sim, chorar. Depois do burnout, eu achei que nunca mais conseguiria me livrar desse choro que sufoca. Nessa época, chorar era só desespero, angústia. Choro de dor, de tristeza, de raiva, medo…
O ato de chorar, hoje em dia, tem um significado completamente novo pra mim.
Chorar é transbordar emoção, seja ela qual for.
Estou transbordando agora e ainda não sei por qual motivo.
Quem disse que a gente precisa sempre ter um motivo?
A gramática já nos deu a dica: chorar é um verbo intransitivo, não precisa de complemento.
Eu desejo que você chore muito.
E se permita sentir todas as emoções que te acompanham, para que nenhuma delas te sufoque e faça com que seu corpo precise gritar por ajuda, como fez o meu.
Depois daquele dia eu decidi que não podia mais me colocar em segundo plano; eu precisava fazer as pazes comigo.
Se você tá vivendo algo parecido e ainda não teve coragem de pedir ajuda, saiba que esse primeiro passo é o mais difícil, mas também o mais importante.
Quando você fizer as pazes com você, vai perceber que tem sim muitos bons motivos pra chorar e se fortalecer a partir disso.
Hoje eu só quero agradecer pela oportunidade de poder contar essa história, chorar e me sentir novamente viva.
Qual o seu motivo pra chorar hoje?
Notas
Estamos quase no fim do Setembro Amarelo, mês de prevenção ao suicídio. Este relato é uma forma de levar a mensagem da não romantização da exaustão para mais pessoas e assim promover uma maior conscientização da importância e do impacto que qualquer tipo de excesso tem na nossa saúde mental.
É a primeira vez que falo abertamente sobre o meu processo de burnout. Espero que essa carta te ajude a perceber os sinais antes de se transformarem em sintomas.